Entrevista com o trio Bolerinho

Entrevista com o trio Bolerinho

*Imagem:  Pétala Lopes

Confira a entrevista com o trio Bolerinho, que nos conta um pouco sobre sua trajetória profissional,  vivências e visões de mundo.

O trio Bolerinho aborda em suas composições referências do cancioneiro popular brasileiro, experimentações sonoras e temas que caminham pela subjetividade feminina. Elas se apresentaram no programa Tardes Musicais – Bolerinho aqui na Fundação Ema Klabin.

[THAIS LEITE] Como surgiu o trio Bolerinho e quais as motivações para a sua existência? Se puderem comentar sobre o nome bolerinho.

[BOLERINHO] O Bolerinho surgiu como um grupo de estudos e diversão entre três amigas (Luisa, Maria e Lívia Nestrovski). Em 2007 as três estudavam na Unicamp e gostavam de cantar, tocar e experimentar arranjos, então decidiram se juntar para recriar um repertório do cancioneiro brasileiro. O tempo foi passando e o grupo se transformando até que em 2018 lançamos nosso primeiro álbum, autoral e feminista. Tocar nossas canções e arranjos, estar juntas para criar a três vozes e com diferentes formações instrumentais, trocar nossas experiências de vida e políticas nos motiva. O nome ‘Bolerinho’ foi dado ao grupo porque a Luísa usava muito bolerinho (aquele casaco curtinho). Mas já nos perguntaram tanto se tocamos Bolero que compusemos até uma canção (que está no nosso disco) com o tema: Bolerê (Luísa Toller/Maria Beraldo/Thiago Melo).

[TL] O clipe de Necrópsia do nosso amor, música que abre o álbum, é bem performático. Como foi o seu processo de criação estética?

[B] Escolhemos a música do Vitor Wutzki (compositor e amigo) e chamamos a Aline Belfort para dirigir. O Thiago Melo teve a ideia de filmarmos no chiqueiro. Gostamos. Começamos a procurar a locação e fazer reuniões para pensar em ideias de ações e figurino. Chegamos numa concepção com texturas e ações non sense. Compramos frutas e levamos alguns objetos, fomos ao brechó comprar algumas roupas. Muita coisa aconteceu no próprio dia pirando nos objetos, nas cenas e teve coisa que veio também na edição (como o close no porco, por exemplo). Cremos que não há exatamente uma explicação, o clipe foi acontecendo. Na equipe temos também a Pétala Lopes assinando a fotografia junto da Aline e na correção de cor, o Rodrigo Lorenza como colaborador na edição e Thiago Melo na produção.

[TL] Vocês mesclam elementos do cancioneiro popular com sintetizadores dentro de uma subjetividade intrinsecamente feminina. Pode se dizer que isso é parte de um movimento específico e especial na música brasileira, no qual as mulheres têm aberto os próprios caminhos para experimentar seus próprios desejos, antes de qualquer coisa?

[B] A gente faz música desde pequenas. Temos muitos exemplos de mulheres criadoras e instrumentistas perto da gente, o que é um privilégio – porque somos minoria, infelizmente – e isso, sabemos, contribuiu pra que a gente emergisse como musicistas criadoras em um meio tão machista. Mas não sabemos se a nossa música tem uma “subjetividade feminina”. Ela é a música feita por nós, e temos consciência de que por sermos mulheres isso já desenha uma postura de resistência dentro da música, mas nossa ideia não é fazer algo com recorte especificamente feminino, muito pelo contrário: nossa ideia é que música feita por mulheres não seja um movimento específico e nem especial, mas sim generalizado e livre de segregações. E sim, temos uma movimentação forte da parte das mulheres na música brasileira hoje, ocupando outras posições com relação às que nos foram dadas a princípio e estando mais unidas do que nunca.

 

Nossa ideia é que música feita por mulheres não seja um movimento específico e nem especial, mas sim generalizado e livre de segregações.

Bolerinho.

[TL] No ano passado vocês fizeram uma turnê pela América Latina. Como foi a experiência, a recepção das pessoas e como vocês enxergam as trocas culturais entre mulheres latino-americanas?

[B] Foi surpreendente! E não porque esperávamos pouco, já pudemos conhecer o carinho e a receptividade da Argentina e do Uruguai em outras ocasiões. Mas desta vez planejamos shows e oficinas com apoio do edital Ibermúsica em três cidades (Buenos Aires, La Plata e Montevidéu) e foi preciso bastante apoio local para que pudéssemos divulgar e ter público para essas atividades. O resultado foi muito gratificante, trocamos muito com as pessoas que compareceram nas oficinas e nos shows, e conhecemos novas artistas maravilhosas. Além disso também trocamos experiências políticas, podendo entender o que temos em comum e as especificidades das lutas feministas nesses países tão próximos e tão diferentes.

[TL] Qual dica ou recado vocês dariam para mulheres que estão começando nas artes, em específico na música e que muitas vezes sentem-se desmotivadas pelo patriarcado?

[B] Que encontrem nas fragilidades sociais a força pra resistir. Que procurem pessoas com situação de vida parecidas pra se inspirar. Que se unam a outras mulheres porque juntas somos mais fortes. Que lembrem como o opressor é a posição mais frágil no fundo. Que nenhum homem pode saber do que você é capaz. Que fodam-se os boy. Que nos ajudem a tocar fogo no patriarcado.

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Estudante de letras e estagiária de comunicação na Fundação Ema Klabin. Integra projetos musicais com a banda Mumanta e audiovisuais através da produtora Alto Mar Audiovisual.

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