Fernando Alves

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Entrevista com Fernando Alves

→ Um dos idealizadores do Violão e Ponto

*Imagem: Fernando Alves. Fotografia: Ronnie Magalhães

Fernando Alves nasceu na cidade de São Paulo. É produtor cultural e atua na música desde a década de 90. Estudou na ULM Tom Jobim (Escola de Música do Governo do Estado de SP) e se formou em Engenharia Eletrônica pela Escola de Engenharia Mauá. Em 2010, Fernando cursou o MBA em Gestão Estratégica e Econômica de Negócios pela FGV e, em 2011, montou a Acalanto Projetos Criativos. Pela Acalanto, Fernando produziu concertos musicais em várias unidades do Sesc, Editais do PROAC, Festivais de Inverno com diversas prefeituras além de Eventos Sociais e Corporativos. Nos anos de 2018 e 2019 a Acalanto atuou em cerca de 280 shows/concertos. Em 2015, participou das Feiras Womex (Espanha) e Classical:NEXT (Holanda), ampliando sua atuação internacional. Foi produtor da Série Encuentros Musicales em El Cervantes e em 2012, Fernando cria o Coletivo Violão e Ponto, projeto que promove o violão instrumental e conta hoje com a gestão coletiva de 15 pessoas. O Violão e Ponto realiza eventos em São Paulo e Porto Alegre, mantém um Portal de Informações sobre o meio violonístico. Tem cerca de 15mil seguidores em suas redes sociais.

O que era uma iniciativa informal para que violonistas mostrassem seus talentos, se transformou em um dos mais expressivos projetos de violão instrumental da atualidade, o Violão e Ponto – O Clube do Violão Solo.

Há seis anos, a Casa Museu Ema Klabin realiza uma parceria com o Violão e Ponto, levando música ao vivo para os palcos do museu. Parceria essa que não cessou nem durante a quarentena. De março até o mês de agosto de 2020, violonistas gravaram direto de suas residências quinze vídeos inéditos que foram divulgados nas mídias sociais da casa museu.

Para conhecer mais sobre esse projeto incrível, conversamos com o violonista Fernando Alves, que é um dos fundadores do projeto Violão e Ponto. Ele falou sobre sua carreira, referências musicais, os grandes nomes do violão na atualidade, a presença feminina no violão, o mercado profissional, a parceria com a Casa Museu Ema Klabin, entre outros assuntos. Confira abaixo a entrevista.

[ Cristina Aguilera] Quando o violão entrou na sua vida?

[ FERNANDO ALVES] Comecei a estudar violão aos 12 anos de idade. Antes disso, porém, dos 8 aos 13 anos, participei do Coral Infantil Canarinhos do Liceu Coração de Jesus, no colégio que eu estudava. Era um coral profissional com ensaios diários e atuação frequente na televisão e em eventos. Essa experiência marcou de forma definitiva minha escolha pela música.

[CA] Quais são suas referências e estilos musicais?

[FA] Durante a adolescência o rock esteve presente muito forte na minha vida. Porém, muito por conta do estudo da música, fui tendo contato com a música brasileira e o jazz, e estes passaram a fazer parte de minhas referências sonoras.
Alguns artistas que eu ouvi e ouço com frequência são: Raphael Rabello, Vinícius de Moraes, Baden Powell, Duofel, Oswaldo Montenegro, Dave Brubeck, Ella Fitzgerald e a Orquestra Jazz Sinfônica.

[CA] Possui composições próprias? Já gravou algum CD?

[FA] Não. Meu trabalho no violão está muito mais ligado à interpretação e arranjos. Não tenho essa veia de composição.

[CA] Quais são os maiores expoentes do violão hoje no Brasil em sua perspectiva? A mulher violonista tem seu espaço no País?

[FA] O Brasil é um país privilegiado quando falamos de músicos. Hoje em dia temos toda uma nova geração de grandes músicos que estão se destacando no dia a dia, inclusive alguns bem novos. Apenas pra citar alguns temos nomes como Swami Jr, Badi Assad, Renata Montanari, João Camarero, Douglas Lora. Isso sem falar nos já muito consagrados.

Sobre as mulheres violonistas, temos a alegria de ter uma geração muito forte e atuante nos palcos. O violão ainda é um ambiente predominantemente masculino, mas essas mulheres estão batalhando de uma forma muito séria para abrir um espaço cada vez maior na cena. Algumas violonistas que posso destacar são: Andrea Perrone, Thais Nascimento, Gabriele Leite, Isabel Luiza, Roberta Gomes, Amanda Carpenedo, Heloisa Carbonera, Alane Miranda, além das já consagradas Paola Picherzky, Renata Montanari, Badi Assad, Maria Haro, Cecília Siqueira e várias outras.

Tive a honra de organizar (pelo Violão e Ponto) alguns eventos com foco na atuação de mulheres violonistas, e os resultados são incríveis. Todo ano fazemos uma (ou mais) edições especiais sobre o tema onde conhecemos mulheres de todas as gerações que tocam violão dos mais variados estilos. Além disso mantemos playlists no spotify com foco no violão instrumental. Essas listas estão recheadas de mulheres violonistas – convido a todos a conhecer. O endereço está acessível por nosso https://linktr.ee/violaoeponto

[CA] Você acha que as universidades de música no Brasil oferecem uma boa preparação para os estudantes?

[FA] Acho que na parte musical sim. Temos ótimos professores e instituições com ótima produção acadêmica. O que acho que falta nos cursos acadêmicos são atividades que resultem numa melhor visão de mercado por parte dos estudantes, acredito que essa parte poderia ser revista no programa dos cursos. Eu vejo os músicos saírem formados, mas sem saber como atuar no mercado profissional da música. Isso impacta muito forte a carreira deles.

[CA] Como você avalia o mercado para o violonista profissional? E no exterior?

[FA] Com exceção da música comercial, mais focada em entretenimento, o Brasil tem um mercado ainda muito imaturo para a música, sem uma cadeia de processos e valores bem organizada, e isso impacta o violonista também. Existem muitas oportunidades para os músicos – grandes eventos, festivais, publicidade, ótimas escolas de música – porém, com um mercado muito pouco organizado em produtores, grandes empresas e associações, as iniciativas se tornam nichos e cabe a cada músico, de forma isolada, descobrir seu mercado. Isso faz com que o músico gaste muito tempo em atividades de produção, ou vendas – quando este poderia estar focando na produção artística.

[CA] E o futuro, quais são as alternativas existentes diante do contexto atual?

[FA] O momento atual é muito difícil para o músico – muitos trabalhos estão completamente congelados ou foram cancelados, e muito material está sendo produzido de forma gratuita, ou com muito pouco recurso. Mas eu acho que as novas plataformas digitais vão se perpetuar. A experiência com a pandemia mostra que existe espaço para a criação de conteúdo e troca de ideias acontecendo de forma online, e acho isso ótimo. Eu acredito que daqui pra frente teremos um ambiente onde eventos terão atividades online e ao vivo dividindo a programação. Isso abrirá novas perspectivas e maior alcance para as iniciativas que souberem navegar bem nesse novo ambiente.

O Brasil é um país privilegiado quando falamos de músicos. Hoje em dia temos toda uma nova geração de grandes músicos que estão se destacando no dia a dia, inclusive alguns bem novos.

Fernando Alves.

Sobre o Violão e Ponto:

 

[CA] Se você tivesse que resumir o Projeto Violão e Ponto em três linhas, o que diria? Fale um pouco sobre a ideia de conceber uma Guitar Society em São Paulo.

[FA] O Violão e Ponto é um grande ponto de encontro de pessoas que gostam de violão instrumental. Através do projeto realizamos uma série de atividades ligadas ao tema, o que resulta na valorização e perpetuação deste tipo de arte.

Foi uma iniciativa informal, tenho que ser franco. Eu, o Rafael Barrera e o Fabyo Aoki começamos a nos reunir em uma livraria de São Paulo pra mostrar uns aos outros nossos trabalhos ao violão solo. Aos poucos mais pessoas foram se juntando ao grupo, os encontros tinham (e ainda têm) um caráter informal onde tocamos violão, conversamos sobre o instrumento e conhecemos pessoas. Desde o início essa iniciativa se mostrou importante, pois ela preenche uma lacuna que existe no violão instrumental. A cena do violão instrumental carece de espaços onde estudantes, músicos em início de carreira possam desenvolver e apresentar seus trabalhos.

[CA] Fale um pouco sobre os processos colaborativo que caracteriza o Violão e Ponto, seja pela curadoria, produção de conteúdo e gestão.

[FA] O Violão e Ponto é completamente organizado de forma coletiva. Somos um grupo de 17 colaboradores que estão sempre em diálogo para elaborar novas ideias e ações pelo violão e ponto. Alguns deles se responsabilizam por ações específicas em atividades como curadoria, comunicação, criação de artigos, produção dos eventos entre outras frentes.

Esse é um modelo muito interessante, pois o Violão e Ponto tem um potencial enorme de realizar atividades ligadas a muitas frentes, e não é possível realizar isso com poucas pessoas. Além disso, um grupo tão diverso como esse que temos é capaz de propor novas ideias e resolver questões de forma muito rápida.

Todas as grandes decisões do Violão e Ponto passam por votação neste grupo, muitas vezes acompanhada de discussões e reflexões muito importantes que são compartilhadas por cada membro. Eu procuro fazer uma coordenação das ações, mas é uma estrutura horizontal, sem hierarquia, a palavra de todos tem o mesmo peso, e utilizamos o voto para a tomada de decisões. É muito bonito ver esse grupo atuando e aprendo muito com cada um deles.

O grupo atualmente é formado por: Alane Miranda, Amanda Carpenedo, Andrea Perrone, Chris Amoretti, Davi Avancini, Fabyo Aoki, Fredy Pietz, Giovana Ferreira, Heloisa Carbonera, Isabel Luiza, Ivan Sakavicius, Leandro Sofia, Lucas Alcarraz, Roberta Gomes, Ronnie Magalhães, Vinícius Motta e eu, Fernando Alves. Vocês podem conhecer mais sobre os integrantes em www.violaoeponto.com.br/colaboradores

[CA] Qual é o legado desse projeto?

[FA] Um legado de valorização do violão instrumental e dos violonistas. Temos um direcionamento na nossa curadoria que reflete esse legado: maximizar a variedade de estilos musicais ao violão, juntar estudantes, novos músicos e violonistas consagrados, valorizar os violonistas mais antigos, mestres que abriram os caminhos que seguimos hoje.

[CA] Quantos músicos já se apresentaram até hoje? Quais os nomes mais conhecidos?

[FA] A natureza de nossos encontros tem um caráter coletivo, o que acaba envolvendo bastante gente. A cada encontro temos um palco aberto que envolve 3 ou 4 músicos e um convidado especial, que faz um pocket show ou um pequeno recital. Ao longo desses 8 anos de projeto fizemos 50 eventos ao vivo e, durante a pandemia fizemos uma série de 18 lives e fizemos o lançamento de 15 vídeos inéditos em parceria com a Casa Museu Ema Klabin. Somando tudo isso a estimativa é que tenham passado cerca de 250 violonistas pelo projeto.

Sobre os violonistas consagrados que já participaram no projeto, posso citar alguns: Antonio Guedes, Swami Jr, Duofel, Fernando de La Rua, Marco Pereira, Giacomo Bartoloni, Conrado Paulino, Duo Siqueira Lima, Paola Picherzky e Thiago Abdalla. Tivemos ainda participações internacionais em atividades online e entrevistas como Christina Sandsengen (Noruega), Gaëlle Solal (França), Andy McKee (USA) e Julieta Comotti (Argentina).

Aqui https://violaoeponto.com.br/edicoes-passadas/ dá pra ver o histórico de eventos, desde o primeiro em outubro de 2012.
E no nosso www.facebook.com/violaoeponto você encontra as fotos dos eventos.

[CA] Descreva a parceria do Projeto Violão e Ponto com a Casa-Museu Ema Klabin?

[FA] A parceria com a Casa Museu Ema Klabin é chave para a continuidade do projeto. Com isso somos capazes de realizar um número maior de atividades, como eventos ao vivo, mesas de conversas e cursos. Somos muito bem recebidos a cada atividade que fazemos nessa parceria e fica claro o respeito que as equipes da casa museu têm pelo Violão e Ponto e pelo violão instrumental. Aliás fica aqui o nosso agradecimento a toda equipe da Casa Museu Ema Klabin, pela parceria nestes anos todos.

[CA] Qual músico vocês gostariam que se apresentasse no projeto e ainda não conseguiram?

[FA] Não sei se tenho essa resposta – como a gestão é coletiva, o tempo todo vão surgindo nomes e ideias de atividades.

[CA] Na quarentena, a parceria com a Casa Museu Ema Klabin continua de maneira virtual. Como os violonistas encaram se apresentar dessa forma?

[FA] Na quarentena fizemos uma série de vídeos inéditos, sempre ligado ao violão instrumental. O violão e ponto faz a curadoria dos vídeos e a casa museu faz o lançamento e comunicação dos vídeos, em suas redes. Já foram ao ar 15 vídeos e teremos mais nos próximos meses. A programação é diversa, e reflete o valor que o Violão e Ponto dá para diversidade de estilos musicais e para os violonistas. É uma dessas iniciativas onde todos saem ganhando: os violonistas tem um espaço bacana para mostrarem seu trabalho, além de se desenvolverem na produção audiovisual. A casa museu tem um conteúdo de alto nível e diversificado e o Coletivo Violão e Ponto segue ativo, cumprindo seu papel de valorizar uma música de alto nível, o violão instrumental e os violonistas.

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Cristina Aguilera

Formada em jornalismo e especializada em Mídias em Educação pela Universidade de São Paulo. Atua há mais de quinze anos na área de Comunicação. É assessora de imprensa da Casa-Museu Ema Klabin e diretora da Mídia Brasil Comunicação Integrada.